Olhando o mar, sonho sem ter de quê
Olhando o mar, sonho sem ter de quê.
Nada no mar, salvo o ser mar, se vê.
Mas de se nada ver quanto a alma sonha!
De que me servem a verdade e a fé?
Ver claro! Quantos, que fatais erramos,
Em ruas ou em estradas ou sob ramos,
Temos esta certeza e sempre e em tudo
Sonhamos e sonhamos e sonhamos.
As árvores longínquas da florestaParecem,
por longínquas, 'star em festa.
Quanto acontece porque se não vê!
Mas do que há pouco ou não há o mesmo resta.
Se tive amores?
Já não sei se os tive.
Quem ontem fui já hoje em mim não vive.
Bebe, que tudo é líquido e embriaga,
E a vida morre enquanto o ser revive.
Colhes rosas? Que colhes,
se hão-de serMotivos coloridos de morrer?
Mas colhe rosas.
Porque não colhê-las
Se te agrada e tudo é deixar de o haver?
Fernando Pessoa
quarta-feira, 21 de janeiro de 2009
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